Fibrose na Estenose Aórtica

Cada vez mais estudamos a fundo detalhes de patologias frequentes no nosso dia a dia. A Estenose Aórtica passa por esse processo já há alguns anos, muito motivado pela vontade do cardiologista de conhecer o ponto ideal de indicação de intervenção em casos duvidosos.

Recentemente, o estudo do miocárdio passou a ser crucial nessa decisão, embora sua observação seja de longa data. Antes, uma sinalização de acometimento sistólico com queda na fração de ejeção motivaria uma indicação de intervenção, mas sabemos que a fração de ejeção, embora validada de forma consistentemente do ponto de vista clínico, está longe de ser o método mais sensível para apontar a repercussão hemodinâmica em nível tecidual.

Outras tecnologias e métodos diagnósticos buscam estudar melhor o músculo do ventrículo esquerdo, como o strain miocárdico e a presença e padrão da fibrose intersticial.

A partir de estudos histológicos, pudemos ver que determinados desenvolvimentos de fibrose interferiram diretamente no comportamento adaptativo do ventrículo esquerdo, levando, inclusive a estados de queda na fração de ejeção, diante de uma pós-carga elevada cronicamente ao longo dos anos.

Outro ponto relevante muito discutido é a capacidade de se reverter tal remodelamento com a resolução da obstrução valvar, o chamado remodelamento reverso ocorre em alguns indivíduos e a presença de fibrose esteve correlacionada em alguns artigos como fator preponderante nesse processo.

Estudos recentes correlacionaram a quantidade de fibrose miocárdica aos padrões de estenose aórtica de baixo gradiente, os estágios D2 e D3, conhecidos por apresentarem prognóstico pior do que a estenose aórtica clássica.

Quanto mais fibrose, maior a chance de termos queda na fração de ejeção, aumento dos diâmetros cavitários e sintomatologia mais exuberante.

A presença de fibrose miocárdica está correlacionada com uma demora maior do remodelamento reverso, embora estatisticamente, a troca valvar aórtica apresente impacto positivo nesse aspecto. De forma geral, em torno de 30% dos pacientes que se submeteram a intervenção apresentam essa melhora ao longo de 18 meses. Assim entendemos que a melhora da pós-carga é benéfica, mas a recuperação pode não ocorrer ou ocorrer de forma mais lenta e com impacto negativo na morbimortalidade.

Um ponto interessante é que alguns estudos mais antigos de pacientes que se submeteram a cirurgia convencional nos mostraram que houve redução da carga de fibrose após 6 ou 7 anos, o que é complexo de se compreender, visto ser a fibrose um processo considerado como irreversível. Alguns autores apontam que o padrão de fibrose difusa poderia ser plástica e evoluir em regressão ao longo dos anos.

Vale ressaltar que ainda de forma incerta, o padrão de hipertrofia isolado na estenose aórtica não se correlacionou ao desenvolvimento de fibrose miocárdica, mostrando que ainda é necessária uma determinada profundidade na investigação para tentarmos uma compreensão mais ampla desse mecanismo.

Quando analisamos dados sobre mortalidade nesses indivíduos, é de conhecimento difuso que pacientes com a presença de fibrose apresentam maior incidência de morte ao longo do acompanhamento clínico, mas a compreensão do comportamento exato da fibrose ainda nos dá a dúvida se estamos vendo causa ou mesmo um simples marcador de gravidade.