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Gênero no Prolapso da Valva Mitral

Mulheres sofrem mais?

Pacientes portadores de insuficiência mitral, obrigatoriamente devem ter em seu rastreio a determinação da etiologia bem definida. Isso é posto, pois o manejo clínico desses indivíduos depende fortemente desse ponto de partida, pois a indicação de intervenção ao longo do tempo muda bastante se o paciente é portador de Valvopatia primária ou secundária.

Quando olhamos para os casos de etiologia primária, o fluxograma de avaliação parece mais simples, mas alguns pontos merecem grande atenção na nossa prática clínica diária.

Dentro desse contexto, em países mais desenvolvidos, a principal causa de uma insuficiência mitral primária é a degeneração com prolapso valvar. Nesses casos, a primeira alternativa terapêutica diante de uma indicação clara, seja por sintomas ou por repercussão hemodinâmica é a plastia, ou reparo valvar.

Observando as casuísticas mundiais, vemos algumas diferenças significativas com relação ao gênero dos pacientes envolvidos. Um olhar menos atento acharia que homens são mais graves por serem a maioria nas coortes de pacientes operados por essa razão, mas o que entendemos quando analisamos mais a fundo os dados é uma realidade bem diferente.

Em geral, os dados nos mostram que em torno de 30% dos indivíduos que se submetem a intervenção são do sexo feminino. Ainda, podemos ver que ao serem referidas para a cirurgia, apresentam valvas mais degeneradas, mais repercussão hemodinâmica e tem evoluções pós-procedimento piores, com maior morbimortalidade no acompanhamento clínico.

Tentando evitar uma leitura simples de viés pré-conceitual relacionado ao gênero, precisamos buscar explicações para esses fatos.

Diante da manutenção em tratamento clínico, que sabemos que não altera a mortalidade, tanto homens, quanto mulheres tem a mesma evolução desfavorável, mostrando que a manifestação final da doença parece não ser diferente.

Um ponto extremamente relevante é com relação aos diâmetros cavitários. Em valores absolutos, as medidas encontradas no sexo feminino eram menores do que no sexo masculino, mas quando indexadas para a superfície corporal, encontramos valores piores nas mulheres. Isso nos leva a crer que há uma subestimação desse parâmetro fundamental nas diretrizes quando mulheres são avaliadas clinicamente.

Ao serem referidas para a intervenção, anatomicamente as valvas mitrais das mulheres se apresentam com doença mais agressiva ou evoluída. Isso poderia ser por uma agressividade mais intensa no sexo feminino, mas na verdade, parece reportar à demora na indicação de intervenção, chegando a paciente em um estágio mais avançado de deterioração do aparato valvar.

Isso é corroborado pelos dados gerais que temos de que as mulheres se apresentam para a cirurgia com idade mais avançada, mais comorbidades associadas e maior grau de sintomatologia, indicando que talvez a observação de indicação antes da sintomatologia esteja sendo fortemente negligenciada no sexo feminino.

Diante disso, mulheres recebem menos reparo valvar do que homens, tendo mais implante de próteses que sabemos ser um tratamento de segunda linha, mas indicado em casos de impossibilidade anatômica do reparo.

Observando dados como mortalidade, vemos que no pós-operatório, mulheres tem evoluções piores e isso pode, inclusive, alimentar um ciclo vicioso enviesado. Ao se deparar com piores evoluções, o subconsciente do cardiologista clínico tende a ponderar mais a indicação cirúrgica nas mulheres, mantendo mais pacientes em acompanhamento clínico, que sabemos ter pior evolução.

Vale ressaltar também que comportamentos sociais podem estar envolvidos nessa questão fora o preconceito direito. Em diversas regiões vemos mulheres se privando de buscar assistência médica por questões sociais como cuidar de filhos e casa, o que altera drasticamente os resultados cirúrgicos e evolutivos.

Diante disso, algumas medidas precisam ser tomadas e alguns comportamentos alterados. A Atenção quanto a indexação da superfície corporal e o uso das novas ferramentas diagnósticas mais sensíveis para encontrar casos com disfunção sistólica subclínica podem ser ferramentas extremamente úteis no acompanhamento clínico das mulheres.

Discussões desses casos em ambiente de Heart Team também são extremamente válidas, pois a abordagem multiprofissional pode oferecer um atendimento que evite uma série de vieses de seleção.

Além de uma abordagem mais empática ao sexo feminino, todas essas medidas devem ser tomadas em conjunto e simultaneamente para buscarmos, se não acabar com esse desbalanço, diminuir intensamente a desproporção na qualidade de atendimento ofertado aos pacientes.

Literatura Sugerida: 

1 – Hahn RT. Sex-related differences in degenerative mitral regurgitation: a call to action. Eur Heart J. 2024 Jul 9;45(26):2317-2319.

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