Nos dias de hoje, quando encontramos um paciente com regurgitação tricúspide importante e que tem uma indicação de intervenção do lado esquerdo, como por exemplo, uma valvopatia mitral, é praticamente consenso a abordagem concomitante das duas lesões.
Digo isso, pois durante muito tempo, tínhamos essa discussão acirrada nas reuniões clínico cirúrgicas, mas no novo conceito de Heart Team e com as inúmeras evidências disponíveis na literatura internacional, essa abordagem com plastia tricúspide é apresentada, inclusive nas diretrizes.
Muito se fala do aumento no tempo de circulação extracorpórea ao realizar ambos os procedimentos concomitantes, mas é visto que esse aumento não parece impactar negativamente os desfechos clínicos, em face dos benefícios de se reduzir a sobrecarga de volume do lado direito do coração.
Recentemente um novo olhar trouxe esse debate novamente, fazendo a comunidade científica se questionar se essa indicação simultânea é mesmo benéfica.
Cirurgia valvar de forma geral, tem algumas complicações que devemos sempre ter em mente quando avaliamos uma determinada indicação e quando conversamos com paciente e família. A necessidade de implante de marcapasso é uma delas.
A maioria dos cardiologistas se preocupa com essa complicação apenas em casos de abordagem transcateter, mas a cirurgia convencional também apresenta índices consideráveis dessa demanda.
A abordagem cirúrgica da valva mitral apresenta uma prevalência de implante de marcapasso definitivo de algo em torno e 7%. Já quando temos a abordagem concomitante da valva tricúspide, esses valores sobem para 14%.
Para termos um grau de comparação, o implante de TAVI com próteses balão expansíveis nos dá cifras em torno de 4 a 6% enquanto as próteses autoexpansíveis mais modernas 10 a 12%.
A razão para essa elevação da prevalência na abordagem da tricúspide é a possível lesão do nó atrioventricular, intimamente relacionado ao anel da valva tricúspide.
Em centros com elevada demanda e expertise, a prevalência de implante de marcapasso é menor do que é visto de forma geral, mas a proporção entre maior demanda em casos e abordagem combinada continua a mesma.
Ao observarmos profundamente as diretrizes, vemos que em casos de insuficiência tricúspide importante, a abordagem acaba sendo indiscutível, mas talvez uma nova reflexão seja necessária em casos de regurgitação moderada e em casos de apenas dilatação de anel tricúspide, sem grande repercussão hemodinâmica, visto determinados riscos inerentes ao procedimento.
No longo prazo, pacientes que implantam marcapasso apresentam mais complicações e também maior risco de mortalidade por causas como endocardite infecciosa ou envolvimento direto do eletrodo com a funcionalidade da valva tricúspide que pode ser tornar novamente disfuncionante.
Uma boa discussão de Heart Team aqui é mandatória para entendermos o melhor caminho a seguir, ouvindo atentamente as demandas do cirurgião e também a performance do serviço quando o aspecto marcapasso é colocado no centro da mesa.