Quando falamos de estenose aórtica, muitas discussões se limitam ao tratamento e resolução da pós-carga aumentada. Obviamente isso é muito importante, mas alguns aspectos merecem uma discussão pormenorizada dentro das possíveis evoluções clínicas da estenose aórtica.
Cerca de 3% dos indivíduos com estenose aórtica importante apresentam sangramentos gastrointestinais, configurando a síndrome de Heyde que pode tornar o manejo clínico desses indivíduos algo desafiador.
Tendo em mente que uma parte dos indivíduos que tenham estenose aórtica experimentam anemia crônica, talvez essa prevalência de síndrome de Heyde seja ainda maior, apenas não sendo notada as perdas pelo trato gastrointestinal.
Relacionado a formação de angiodisplasias na mucosa gastrointestinado na presença de um alto stress de cisalhamento ao passar o fluxo de sangue pela valva aórtica estenosada, as partículas de von Willenbrand acabam se rompendo, propiciando o sangramento.
Ainda para tornar esse manejo mais complexo, não é incomum que pacientes portadores de estenose aórtica façam uso de antiagregantes ou anticoagulantes por outras patologias concomitantes, elevando o risco de sangramentos graves.
A proposta é que o tratamento intervencionista traga solução para os quadros de sangramento, visto encerrar a deterioração do fator de von Willenbrand. Observando na literatura, dados de inúmeras publicações nos mostram que em 2 anos, temos quase 90% dos pacientes sem sangramentos. Curiosamente os dados obtidos de cirurgia apresentam valores melhores do que aqueles que foram submetidos a TAVI, mas esses dados são recheados de viés, visto que os pacientes TAVI desses bancos de dados são bem mais complexos do que os cirúrgicos.
Quadros de mismatch ou mesmo leak paraprotético após o tratamento da estenose aórtica trouxeram dados piores quanto a regressão da síndrome de Heyde, provavelmente por manterem algum grau de cisalhamento.
O uso de antiagregantes não interferiu na recuperação da síndrome após o tratamento, mas agregou a maior risco de sangramentos periprocedimento de forma relevante.
Agora um ponto que ainda é obscuro é a regressão da angiodisplasia em si. Inicialmente não dispomos de publicações estruturadas metodologicamente para entendermos através de endoscopias seriadas após a troca valvar e o mecanismo para essa involução também não é clara.
Com o envelhecimento populacional e cada vez mais pacientes com estenose aórtica no consultório, a tendência é vermos com maior frequência essas evoluções e aparentemente, o tratamento proposto parece ser suficiente para interromper o sangramento, mas entender a fisiopatologia completa ainda será um desafio dos próximos anos…