Há bem pouco tempo atrás, falávamos basicamente em dois tipos de insuficiência mitral, a primária e a secundária, como se apenas isso já fosse o suficiente para diferenciarmos um perfil epidemiológico, anatômico e hemodinâmico de outro.
Isso era importante, pois já de partida havia uma condução distinta entre as duas situações, mas com o avanço dos métodos diagnósticos cada vez mais acurados e o surgimento de novas opções terapêuticas intervencionistas ou não, passou-se a ser fundamental estratificar melhor esses perfis, surgindo assim subtipos dentro da divisão inicial entre primária e secundária.
Deixando nosso olhar apenas sobre a etiologia secundária, o aprendizado que obtivemos com os trials que utilizavam os dispositivos de clipagem mitral impulsionaram o aprofundamento do estudo nos subtipos e suas apresentações.
Quando analisamos estruturalmente o coração, a forma como a qual o aparato mitral se torna disfuncionante em um paciente com miocardiopatia dilatada é diferente daqueles que apresentam fibrilação atrial de longa permanência e alteram a conformação do anel valvar mitral.
Para além disso, a abordagem farmacológica é complemente diferente entre esses indivíduos. Já apontamos aqui algumas vezes que o paciente que apresenta grandes dilatações ventriculares e cursam com insuficiência mitral geralmente se enquadram mais no espectro da insuficiência cardíaca com queda na fração de ejeção e aqueles com dilatações de átrio e anel mitral, se aproximam mais dos pacientes com insuficiência cardíaca e fração de ejeção preservada.
No caso do esteriótipo da queda na fração de ejeção, a proposta intervencionista deve ser observada depois da otimização com fármacos que notadamente melhoram a sintomatologia e principalmente a sobrevida. Casos em que temos fibrilação atrial, deveríamos pensar em ablação, cardioversão farmacológica, enfim, estratégias diferentes para serem tentadas em pacientes chamados de forma geral de insuficiência mitral funcional.
Um ponto que ainda não foi aprofundado na literatura é que as conclusões que temos são baseadas muito em parte sobre o uso de medicamentos tradicionalmente conhecidos e com seus desfechos testados. Os novos fármacos ainda foram pouco testados com o viés de avaliação da regurgitação mitral. Portanto, a associação de sacubitril-valsartana e o uso dos inibidores da SGLT2, tanto na presença ou não da queda da fração de ejeção podem nos trazer insights importantes nos próximos anos.