Boa parte das discussões sobre insuficiência tricúspide já saíram do praticamente ultrapassado “valva esquecida” e passaram para outro ponto de interesse, o impacto na mortalidade.
E é nesse ponto que algumas publicações causam grande estresse e debate nas mesas direcionadas para os novos tratamentos percutâneas da valvopatia tricúspide.
Utilizando mecanismos de clipagem valvar, alguns dispositivos tem apresentado dados de acompanhamento clínico de prazos ainda curtos, de um ano de seguimento e temos encontrado um bom impacto na qualidade de vida e sintomatologia, mas pouca coisa sinaliza para melhora na curva de sobrevida.
Uma publicação recente trouxe ainda mais informações, agora numa perspectiva de mundo real em que foram acompanhados pacientes que se submeteram à clipagem da valva tricúspide.
Os trials bem desenhados nos mostraram que esse era um procedimento seguro e que apresentava bons resultados técnicos na redução da regurgitação e observando os dados de mundo real, esse foi um ponto confirmado, trazendo mais segurança na indicação dessa abordagem.
Trazendo ainda mais valor sobre esse achado, vale ressaltar quer os pacientes desse registro de mundo real tem anatomia pior, graus mais avançados de regurgitação e sintomatologia mais exuberando do que encontramos nas primeiras coortes analisadas.
Um dado interessante é que, quando a clipagem resultava numa regurgitação residual acima de moderado, encontrávamos aumento da mortalidade o que poderia ser interpretado como um resultado positivo pensando nesse desfecho.
No entanto, aqui cabe uma grande reflexão sobre o que de fato estamos procurando e mais, o que vamos enxergar.
Quando falamos em mortalidade secundária a insuficiência tricúspide precisamos entender se essa regurgitação é um marcador de gravidade de outra doença, ou se é de fato o causador de sintomas e impacto hemodinâmico.
Se estamos lidando com um marcador, tratar a valva tricúspide nem deveria ser pensando em reduzir mortalidade e sim melhorar qualidade de vida e sintomas.
Essa é uma questão que não vemos nos desenhos atuais dos trials de forma clara e ainda podem trazer uma série de vieses nos achados finais.
Mas se estamos lidando com uma regurgitação tricúspide grande e que o impacto dessa regurgitação seja, de fato, a causa da disfunção ventricular direita, da congestão venosa periférica e possíveis disfunções orgânicas, o tratamento dessa valvopatia parece que vai impactar positivamente a curva de mortalidade.
Sobre o achado específico desse registro, entender uma regurgitação residual acima de moderado na verdade pode apontar também para um relativo insucesso da intervenção e deve ser interpretado com muita cautela dentro de todo esse contexto.
Ainda teremos muito a caminhar para tentar entender melhor sobre a regurgitação tricúspide dentro de um contexto maior de cardiopatia estrutural. Assim, poderia ser possível sinalizarmos um grupo de pacientes que poderia ter maior benefício de intervenção. E depois disso tudo, voltar a mesa da fisiologia básica e revisar todo o impacto disso na função renal e repercussão hemodinâmica de uma hipervolemia a ser tratada.