Estamos em uma fase da cardiopatia estrutural em que buscamos entender mais a fundo determinados aspectos da fisiopatologia, frente a uma série de métodos diagnósticos cada vez mais acurados e sensíveis do ponto de vista de encontrarmos mais rápido determinadas repercussões.
Genereux há alguns anos nos trouxe uma classificação funcional na estenose aórtica em que ele correlacionava a repercussão hemodinâmica encontrada no coração com o avanço da doença. Casos em que havia acometimento do lado direito do coração tinham um prognóstico pior do que aqueles que a estenose aórtica estava causando repercussão apenas do lado esquerdo.
No entanto, indivíduos com estenose aórtica, de forma geral, apresentam-se com diversas outras comorbidades, principalmente quando estão em idades mais avançadas, até pelo motivo de termos diversos fatores de risco em comum com doença arterial coronariana.
A classificação funcional se limitava, no contexto da publicação a pacientes que já estavam com estenose aórtica importante, ou seja, com uma área valvar menor do que 1cm2. Dados sobre outros estágios da doença ainda são incertos e demandam mais investigações, embora o racional fisiopatológico faça sentido.
Com o desenvolvimento da estenose aórtica, vemos uma elevação crônica da pós-carga iniciando uma série de mecanismos adaptativos para tentar manter estável o stress de parede. Em pacientes com estenose aórtica de grau moderado já é possível ver esse acometimento do que chamamos atualmente complexo ventrículo-valvar.
Em um contexto de doença valvar discreta, achados levantam uma série de discussões interessantes que merecem destaque.
A princípio, danos miocárdicos são identificados com grande frequência em pacientes com estenose aórtica discreta, mas após correção para os fatores de risco, não há correlação entre a presença de estenose aórtica e o dano cardíaco.
A leitura desse achado é interessante e sugere fortemente que diversas outras comorbidades trazem sobrecarga em diversos graus e mecanismos ao miocárdio e é bem provável que a presença deles leve a uma possível evolução da estenose aórtica. Seguindo o raciocínio, a partir de um ponto, a estenose aórtica já mais avançada começa a levar a lesão miocárdica também em um ciclo vicioso evolutivo e prejudicial.
Em fases iniciais, a sobrecarga de pressão ocasionada por uma estenose leve não é suficiente para ser a responsável pelos danos miocárdicos.
Entender a estenose aórtica parece ver que ele parece nascer como uma doença metabólica e que em fases avançadas, muda sua característica para uma doença mecânica que, a princípio não tem mecanismos de regressão diferente da intervenção direta na valva.
Se teremos alguma possibilidade de atuar nas fases iniciais cheia de comorbidades que chegam a, inclusive, criar dano miocárdico pensando na valva aórtica, nos parece precipitado afirmar. Até porque, tratar as comorbidades, além de evitar o dano miocárdio em algum grau, evita o gatilho para uma possível evolução da estenose aórtica, pelo que conhecemos atualmente.