Para quem acha que os pacientes que se submetem a TAVI já estão estudados em sua plenitude, algumas publicações nos trazem visões distintas desse ponto.
As discussões sobre trombogenicidade e sangramento nesses indivíduos é sempre muito delicada e lidar com essa balança pode ser um grande desafio para o cardiologista clínico.
Em torno de um terço dos pacientes que vão ser submetidos a TAVI fazem uso de anticoagulantes orais de forma permanente e o periprocedimento nos traz questionamentos sobre a manutenção ou não dessa classe medicamentosa durante a internação, visto que a intervenção, por si só, eleva os riscos de sangramento e a interrupção pode elevar os riscos de complicações trombóticas, afinal sua indicação é por essa razão.
Recentemente um trial tentou avaliar qual seria a melhor alternativa dentro desse contexto, pagar o risco de ter mais sangramento e evitar fenômenos tromboembólicos ou retirar o anticoagulante.
Para um leitor menos experiente e que, principalmente, tem o errado hábito de ler apenas resumos e conclusões dos artigos, a primeira dificuldade já aparece. O resultado desse trial foi de ausência de não-inferioridade da interrupção da anticoagulação oral em relação à sua manutenção.
Trocando em um linguajar mais simples, o que foi encontrado nessa avaliação é que suspender o anticoagulante não aumenta o risco de fenômenos trombóticos, mas reduz a incidência de desfechos combinados como sangramentos graves, mortalidade cardiovascular, AVC e infarto.
Embora a grande maioria das intercorrências encontradas sejam consideradas como sangramento leve pelo VARC-3, as complicações de viés trombótico não se elevaram.
Vale ressaltar que a publicação destaca que em casos selecionados com elevado risco de fenômenos trombóticos, os achados talvez não possam ser extrapolados, visto que a população-alvo foram de pacientes gerais que se submeteram a TAVI e não uma subpopulação de alto risco.
Outro achado muito curioso que o artigo nos traz é que quando o paciente vem em uso de um DOAC, a tendência maior é de suspensão para o procedimento o que não vemos com o uso da varfarina, muito provavelmente pelas dificuldades técnicas com a suspensão do cumarínico e sua reintrodução. E mesmo assim, os achados do trial são consistentes independente de qual anticoagulante esteja sendo usado.
Vale ressaltar que esses achados parecem vir na contramão da maioria das publicações em cardiologia geral em que a manutenção da anticoagulação parece não trazer desfechos negativos para esses pacientes. Talvez entender melhor o subgrupo de pacientes em questão seja mais importante do que uma simples generalização de recomendações com relação ao manejo da anticoagulação peri-procedimento.
Um ponto de discussão sempre presente nesse tipo de publicação é sobre o rastreio de alterações consideradas subclínicas e pode ser colocado como uma limitação aqui também. Não foi realizado rastreio com exames de imagem para avaliar o comportamento da formação de trombos em dispositivos ou cavidades, bem como neuroimagem para pesquisa de eventos seja trombótico ou hemorrágico.
Aqui vale a máxima, não devemos generalizar e sim individualizar, com certa evidência de que pacientes TAVI sangram mais.