Quando o TAVI veio como alternativa terapêutica para pacientes com estenose aórtica, tínhamos na mente um paciente grave, que não teria a menor condição de suportar a abordagem cirúrgica convencional e, acabaria invariavelmente, sendo conduzido de forma conservadora, com tratamento clínico sem impacto real na curva de mortalidade.
E foi baseado nesse cenário clínico que o benefício do TAVI enquanto método terapêutico começou a ser demonstrado na publicação do primeiro PARTNER trial.
Os anos se passaram e, atualmente, temos evidências robustas do uso desse método em pacientes de qualquer risco cirúrgico, inclusive aqueles com bom estado geral e baixo risco cirúrgico.
No entanto, alguns pacientes, por diversas razões, acabam encontrando o serviço de saúde em fases avançadas da doença, já em um contexto clínico deteriorado e algumas vezes em choque cardiogênico.
Sabemos que doenças valvares podem ser apresentar clinicamente dessa forma, com uma evolução baseada na história natural da doença, chegando a múltiplas descompensações necessitando de visitas a prontos atendimentos até mesmo a falência cardíaca franca.
Tradicionalmente esses pacientes, em sua grande maioria são conduzidos de forma conservadora com suporte medicamentoso e apresentam desfechos negativos no curto espaço de tempo. Esses indivíduos apresentam em algumas casuísticas, uma mortalidade de 90% em menos de 2 anos com esse suporte clínico.
Alguns serviços tentam um algo a mais, realizar uma valvoplastia com cateter balão que alivia de forma transitória a pós-carga ventricular e poderia servir de ponte para um outro tratamento definitivo, pois sabemos que esse procedimento teria uma validade entre aspas de até 6 meses.
Uma recente avaliação do banco de dados norteamericano do STS nos mostrou dados interessantes da abordagem intervencionista de pacientes com estenose aórtica importante e que se apresentavam em choque cardiogênico.
Em mais de 5 mil pacientes, a abordagem direta com a realização de TAVI se mostrou benéfica a esses pacientes com claro impacto na mortalidade e excelentes resultados técnicos, com mais de 95% de sucesso de acordo com o VARC-3.
Obviamente em uma análise de propensão, pacientes que foram submetidos a TAVI estando em choque cardiogênico apresentaram mortalidade maior do que aqueles em um contexto hemodinâmico melhor, mas foram infinitamente melhores do que aqueles manejados de forma conservadora. E isso se dá, pois são pacientes com mais comorbidades, mais idosos e em um status momentâneo pior.
Além disso, numa análise de referência cortando aos 30 dias, os riscos de mortalidade em 1 ano foram semelhantes nos dois grupos, enquanto os sobreviventes notaram melhorias significativas na qualidade de vida e no status funcional, ou seja, se o paciente sobreviver aos primeiros 30 dias, a evolução tende a ser semelhante.
Embora uma pequena porcentagem dos pacientes atualmente que se submetem ao TAVI, menos de 2%, estejam em choque cardiogênico, é necessário mudarmos a mente e entender que esse procedimento é possível nesse contexto e com bons resultados.
Temos que ter em mente que uma publicação baseada em dados observacionais pode apresentar o viés de seleção de pacientes e os casos mais graves não terem sido submetidos a intervenção, mas isso corrobora o ideal de Heart Team em que a decisão é individualizada e busca-se, muitas vezes, evitar o tratamento fútil.
Nesse contexto um TAVI primário é talvez a abordagem mais apropriada, assim como pudemos aprender na curva de conhecimento da angioplastia coronariana. Antes o Stent só era implantado de forma eletiva e com total estabilidade e agora é o tratamento de escolha para quadros agudos e instáveis de doença coronariana. Por esse espectro, TAVI não é apenas apropriado, TAVI salva vidas!