Quando estávamos acompanhando o nascimento dos procedimentos TAVI, tínhamos trabalhos estruturados para demonstrar a segurança e a resolução dos quadros de estenose e, dentro desse contexto, uma série de limitações eram impostas nos trails.
Pacientes que tinham dupla lesão aórtica eram desconsiderados para os trabalhos iniciais, assim como aqueles que tinham valva aórtica bicúspide.
Os anos se passaram e vivenciamos uma expansão das indicações dessa intervenção a uma série de pacientes com características especiais. Isso colocou a prova os dispositivos e a técnica proposta ao mundo real, onde nem sempre todas as características eram controladas.
Atualmente, pacientes que apresentam lesões regurgitativas na valva aórtica podem realizar o procedimento sem contraindicação, bastando ter uma característica anatômica compatível e cálcio o suficiente para devida ancoragem.
Algumas publicações davam conta, inclusive, do tratamento de regurgitação aórtica pura com o implante de próteses TAVI convencionais, demonstrando em alguns casos resultados interessantes, mas com maiores taxas de embolização e complicações.
Vale ressaltar que em determinado momento, a preocupação com essas complicações motivou o desenvolvimento de dispositivos dedicados ao tratamento da insuficiência aórtica pura que também apresentava bons resultados iniciais, trazendo um questionamento se uma prótese TAVI convencional poderia ser usada da mesma forma do que essa dedicada para os casos de lesão regurgitativa.
Embora algumas publicações trouxessem dados controversos, uma metanalise veio para tentar comparar os dispositivos correlacionando com os desfechos que mais preocupam na cardiologia clínica.
As próteses dedicadas, que agora estão disponíveis no mercado brasileiro se mostraram superiores em relação a desfechos importantes como mortalidade em 30 dias e 1 ano.
Observando outros desfechos, a utilização de próteses dedicadas também se mostrou interessante, com menor índice de marcapasso, menor grau de regurgitação residual e de eventos hemorrágicos.
Quando observamos ocorrência de AVC, vemos uma menor quantidade do que o procedimento TAVI para estenose aórtica, mas comparando os dispositivos, a ocorrência é semelhante na insuficiência aórtica pura.
Uma boa explicação para esses achados está na fisiopatologia da doença. Pacientes com regurgitação pura tem menos calcificação valvar o que reduz a incidência de AVC, mas com a utilização de próteses TAVI convencionais, aumenta o risco de marcapasso.
O anel calcificado serve de proteção ao sistema condutor em algum grau e próteses convencionais costumam ser superdimensionadas para se tentar evitar uma possível embolização, o que acaba pressionando o sistema condutor. Nos casos de próteses dedicadas, a ancoragem ocorre no folheto nativo, evitando a compressão do sistema de condução.
Achados como esses corroboram a ideia de que nem toda prótese TAVI é igual a outra. A escolha baseada em design e racional de funcionamento, bem como uma adequada seleção do paciente devem atuar junto com evidências robustas publicadas na literatura mundial.
Enquanto não tínhamos dispositivos dedicados, as complicações eram consideradas aceitáveis, mas agora, a decisão de Heart Team pode ser ainda mais precisa.
Literatura Sugerida:
1 – Samimi S, Hatab T, Kharsa C, et al. Meta-Analysis of Dedicated vs Off-Label Transcatheter Devices for Native Aortic Regurgitation. JACC Cardiovasc Interv. 2024 Oct 25:S1936-8798(24)01162-2.
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