Pode TAVI?
O choque cardiogênico é uma condição grave, que apresenta alta taxa de mortalidade e, quando associado a estenose aórtica importante, seu tratamento torna-se ainda mais desafiador. Esses pacientes, na maioria das vezes, não são candidatos ao tratamento cirúrgico de troca valvar, sendo a valvoplastia aórtica por balão o tratamento recomendado por diretrizes. No entanto, os resultados clínicos deste procedimento são desfavoráveis, com uma taxa de mortalidade de 70% em um ano de seguimento.
Nesse contexto, a TAVI torna-se atrativa para o tratamento do choque cardiogênico, considerando seu caráter menos invasivo em relação ao tratamento cirúrgico, bem como a possibilidade de tratamento completo da valvopatia aórtica, melhorando a performance ventricular, o que possivelmente pode ser o fator decisivo para retirar o paciente dessa condição hemodinâmica.
Um estudo observacional multicêntrico, publicado recentemente no European Heart Journal, avaliou 5006 pacientes que foram submetidos a TAVI com próteses balão expansíveis de terceira e quarta gerações (Sapien 3 e Sapien 3 Ultra) entre os anos de 2015 a 2022 e comparou com um grupo controle (sem choque circulatório). Foram considerados pacientes com choque cardiogênico aqueles que foram codificados em prontuário pelo menos 24h antes do procedimento, os que necessitaram uso de inotrópicos ou de suporte circulatório mecânico e os que sofreram parada cardiorrespiratória nas 24h prévias ao procedimento.
Como esperado, na análise não pareada, o grupo que apresentava choque cardiogênico apresentava características de maior gravidade (menor fração de ejeção, menor área valvar, maior prevalência de valva bicúspide e maior grau de disfunção renal) e em relação ao procedimento, no grupo de choque a via transfemoral foi menos utilizada (93% vs. 95%) em relação ao grupo controle. Para reduzir a diferença entre os grupos, realizou-se um pareamento entre os grupos utilizando um escore de propensão, pareando 4952 pacientes para cada grupo.
O grupo choque cardiogênico apresentou maior taxa de mortalidade em 30 dias (12,9% Vs. 4,9% HR 2.73 [2.35–3.18] p <0.0001) e maior incidência de AVCs (3,2% Vs. 1,9% HR 1.76 [1.36–2.29] p <0.0001), além de maior frequência de complicações vasculares, sangramento e necessidade de diálise, em relação ao grupo controle. No entanto, não houve diferenças na necessidade de re-intervenção, implante de marcapasso ou IAM periprocedimento entre os grupos.
Na análise de 1 ano, a mortalidade foi maior no grupo que apresentava choque cardiogênico (29,7% Vs. 22,6% HR 1.57 [1.43–1.72] p <0.0001), principalmente à custa da mortalidade dos primeiros 30 dias. Analisando-se a mortalidade após este período, não se observa diferença estatisticamente significativa entre os grupos (19.3% vs. 18.5%, HR, 1.07; 95% IC 0.95–1.21; P = 0.26), sugerindo que pacientes sobreviventes ao choque cardiogênico tratados com TAVI teriam a mesma sobrevida que o grupo sem choque.
Os preditores isolados de mortalidade em 30 dias foram: idade, menores gradientes médios, menores níveis de albumina, doença renal crônica avançada, necessidade de marcapasso, pressão arterial diastólica e uso de suporte circulatório mecânico.
Com relação aos achados ecocardiográficos pós procedimento, tanto o gradiente médio obtido (10 mmHg), quanto a incidência de leak paravalvar (0,9%), foram semelhantes entre os grupos. Nos sobreviventes ao procedimento, observou-se uma melhora significativa da fração de ejeção do ventrículo esquerdo de 39% para 47% e, posteriormente, para 52% em 30 dias e 1 ano, respectivamente. Essa melhora da fração de ejeção foi semelhante entre os grupos em 30 dias (variação de 6,5-6,7%). Em 1 ano de seguimento, a variação foi maior no grupo com choque cardiogênico (11,9% Vs. 10%). Além disso, houve uma melhora significativa da qualidade de vida em 1 ano.
Esse estudo demonstrou que a TAVI é uma opção segura e eficaz para o tratamento de pacientes com estenose aórtica em choque cardiogênico. Quando comparada a valvoplastia aórtica com balão em estudos anteriores, mostra-se muito mais efetiva e com taxa semelhante de complicações.
Vale ressaltar que esse trabalho foi realizado com próteses balão expansíveis de terceira e quarta gerações, sendo necessária a validação no contexto de próteses auto-expansíveis. Além disso trata-se de um estudo observacional, suscetível a diversos vieses inerentes ao método, porém, vale ressaltar, que nesse cenário de choque cardiogênico e estenose valvar aórtica há uma dificuldade muito grande de executar estudos clínicos randomizados.
Portanto, podemos concluir que a TAVI com próteses balão-expansíveis em pacientes com estenose aórtica grave e choque cardiogênico foi eficaz, contribuindo para melhora de qualidade de vida, melhora da fração de ejeção e apresentando baixo índice de complicações.
Literatura Sugerida:
Click Valvar Academy#486 – TAVI no Choque Cardiogênico
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