Passamos muito tempo discutindo sobre estenose aórtica e os aspectos benéficos da intervenção, muito baseado na tradicional curva de mortalidade publicada por Eugene Brauwald na década de 60 do século passado.
Uma vez que surgem os sintomas, a curva de sobrevida muda drasticamente e a única terapia disponível, nos dias de hoje, capaz de interferir positivamente nisso é a troca valvar, seja por cirurgia convencional ou TAVI.
Mas mesmo com tantas evidências sobre esse assunto, ainda vemos inúmeros pacientes portadores de estenose aórtica que não são encaminhados para a intervenção por diversas razões, como anatomia, risco cirúrgico, indisponibilidade de determinada técnica ou mesmo desconhecimento técnico dos profissionais que atendem esses pacientes.
Dados relativos a análises populacionais chegam a relatar que 40% dos pacientes que foram diagnosticados com estenose aórtica importante acabam não indo para intervenção durante 4 anos de acompanhamento.
É sabido que o risco de mortalidade aumenta de acordo com a severidade da obstrução da valva aórtica e observar os pacientes já no estágio de estenose moderada traz uma série de questionamentos.
A maior parte dos indivíduos são classificados como estenose aórtica discreta, mas o número de indivíduos classificados como portadores de lesões moderadas é tão elevado quanto o daqueles classificados como importante e compreender melhor esse grupo pode ajudar a mudar o espectro de tratamento nos próximos anos.
Um ponto que merece cautela aqui é a precisão no diagnóstico, visto que estenose moderada é, sem sombra de dúvidas, um grande desafio técnico. Estados de baixo fluxo, baixo gradiente, bem como janelas acústicas inadequadas podem erroneamente levar a essa classificação, enquanto na realidade trata-se de um paciente com estenose aórtica importante.
Inclusive, por essa razão, a tradicional classificação em três estágios, discreto, moderado e grave é questionada, visto termos um grande distanciamento entre risco de eventos entre o espectro discreto a moderado e moderado a importante, embora essa validação ainda esteja longe de acontecer.
Esse tipo de avaliação populacional acaba não trazendo informações precisas sobre a real causa dessa defasagem nas indicações de intervenção que de fato chegam a ocorrer, mas podem ter sido influenciadas por questões como opção do paciente, futilidade no tratamento ou estados assintomáticos sem um screening aprofundado.
Enfim, mais uma vez temos dados que corroboram a morbimortalidade da estenose aórtica e é missão do cardiologista entender as razões desse subtratamento! O que podemos fazer de imediato? Impulsionar a educação médica de qualidade, pois assim atingimos mais pontos vulneráveis nessa cascata de eventos que culmina em 40% de pacientes não adequadamente abordados.