Estenose mitral – Parte 1
O sopro da estenose mitral é, sem dúvidas, o mais complexo e desafiador dos sopros para se aprender a diagnosticar. De descrição clássica, todos os entusiastas das doenças valvares conhecem bem, mas na prática a história é um pouco diferente.
A estenose mitral gera ruídos diversos e com muitos detalhes que merecem a atenção do examinador. Desde indivíduos sem alteração alguma no exame físico até aqueles com a ausculta clássica do ruflar, temos um largo espectro de possibilidades.
Vamos discutindo os possíveis achados e compondo as diversas possibilidades de ausculta.
Como sabemos, a maior prevalência etiológica da estenose mitral é a reumática e, por essa razão, a fusão comissural é a marca obrigatória. Em fases iniciais, podemos encontrar uma valva acometida, mas sem causar gradiente diastólico suficiente que causasse repercussão clínica. Nesse momento, a ausculta do paciente pode ser inocente, ou apresentar apenas um estalido diastólico de abertura. Assim, a ausculta pode demonstrar apenas um desdobramento da segunda bulha, com a tradicional ausculta TUM-TRÁ.
A partir do momento em que a estenose avança, o gradiente diastólico pode ir subindo e gerar uma aceleração do fluxo. Nesse ponto, a ausculta de ruídos podem ser percebidos e surge o famoso ruflar diastólico. Muitas vezes esse ruflar é auscultado junto do estalido de abertura, exatamente na sua sequência.
Como você leitor já leu as páginas anteriores e está com o conceito de B4 bem clara na sua mente, a possibilidade de encontrarmos um achado na estenose mitral fará todo o sentido.
Ao final da diástole do ventrículo esquerdo, um pouco antes da primeira bulha, ocorre a contração do átrio. No contexto de um ventrículo enrijecido, essa contração pode gerar a B4, mas aqui a questão é outra. Diante de uma valva relativamente estenosada, a contração do átrio acelera novamente o fluxo através dessa valva elevando a intensidade do sopro. Nesse momento, podemos ter o ruflar diastólico com a elevação da intensidade no terço final, o que denominamos de reforço pré-sistólico.
Assim, compomos a ausculta mais clássica da estenose mitral, um estalido de abertura, seguido de um ruflar diastólico e um reforço pré-sistólico.
A descrição de ruflar se deve a semelhança do sopro diastólico com o ruflar de tambores que víamos nas frontes de batalha. Embora isso possa não ser exatamente perceptível no exame físico, quem ausculta um ruflar, costuma nunca mais esquecer sua característica.