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Febre Reumática

Como prevenir o avanço da doença? 

A Febre Reumática (FR) é uma complicação da infecção pelo estreptococo do grupo A que ocorre principalmente durante a infância, devido a uma resposta imune anormal e exacerbada, se manifestando cerca de 3 semanas após o quadro de faringoamigdalite. 

Com uma incidência de aproximadamente 350.000 novos casos por ano em crianças de 5 a 14 anos, a Doença Cardíaca Reumática (DCR) é a maior causa de morbimortalidade cardiovascular em jovens e crianças nos países em desenvolvimento. Dados demográficos do “Population Reference Bureau” estimam que cerca de 80-85% das crianças com menos de 15 anos vivem em áreas endêmicas da DCR.  A história natural da doença está associada à precariedade socioeconômica, ausência de uma prevenção adequada e a dificuldade de acesso ao sistema de saúde local. Atrelado a isso, a falta da padronização de um programa de rastreio e profilaxia eficientes para a doença dificultam o diagnóstico precoce, acarretando um pior prognóstico e favorecendo a recorrência do quadro.

Nesse contexto, as medidas de prevenção da FR são as melhores estratégias para o controle da doença em países subdesenvolvidos.  Um artigo publicado na revista The Lancet em 2012, “Rheumatic Heart Disease”, abordou, categoricamente, cada uma dessas estratégias, ressaltando a importância delas na erradicação da doença. 

Como prevenção primordial, o artigo destaca a necessidade da eliminação de fatores de risco dentro da comunidade no estágio inicial, através de medidas de saneamento básico, higiene, acesso a cuidados médicos e melhoria nas condições de vida. A prevenção primária consiste no tratamento adequado de uma infecção orofaríngea pelo estreptococo, com a Penicilina, para evitar que o primeiro ataque de FR ocorra. 

Já a prevenção secundária consiste na antibioticoterapia contínua para aqueles que já tiveram um evento prévio de febre reumática, a fim de evitar novas infecções pelo Estreptococo e, dessa forma, novos surtos ou até mesmo fases crônicas da doença. 

Por fim, a prevenção terciária consiste no tratamento cirúrgico das complicações desenvolvidas em um portador crônico de FR, visando melhorar a qualidade de vida do indivíduo.  

Apesar de o diagnóstico da febre reumática ser essencialmente clínico, exames auxiliares, como o Ecocardiograma com Doppler, têm ganhado importância por auxiliarem na detecção precoce de novos casos. Um programa de avaliação realizado em Tonga mostrou que pelo menos metade dos casos de DCR em crianças passam despercebidos quando detectados apenas pela abordagem clínica clássica. 

Além disso, um estudo comparativo realizado com crianças em idade escolar no Camboja e em Moçambique comprovou que um simples protocolo de 5-10 min utilizando o exame se provou dez vezes mais eficiente do que utilizar somente critérios clínicos para diagnóstico. 

Outro estudo publicado na revista Heart em 2005, “Long term follow up of the rheumatic fever and predictors of severe rheumatic valvar disease in Brazilian children and adolescents”, acompanhou 258 crianças e adolescentes na Universidade Federal de Minas Gerais – Brasil, desde seu primeiro quadro de febre reumática aguda, por um período que variou de 2 a 15 anos. 

Com o objetivo de avaliar o progresso das lesões valvares através de parâmetros clínicos e ecocardiográficos, seus resultados mostraram que 71,2% dos pacientes desenvolvem doença valvar evidenciada no ecocardiograma e 15,9% evoluíram para lesões mitral e aórtica crônicas graves. 

Além disso, 33,6% dos pacientes que desenvolveram cardite apresentaram exame físico normal na fase crônica, enquanto apenas 6,2 % destes apresentaram achados ecocardiográficos normais, evidenciando a importância deste exame para o diagnóstico da doença, principalmente em fases precoces e subclínicas. 

Outra ferramenta importante no combate à doença são as estratégias de prevenção e o acompanhamento desses pacientes após o primeiro ataque de Febre Reumática Aguda. Medidas profiláticas como a eliminação dos fatores de risco, acesso à informação e a erradicação do estreptococo do grupo A com Penicilina são de extrema eficiência, entretanto ainda são negligenciadas em países subdesenvolvidos. 

Outras limitações importantes da prevenção primária são a presença de quadros assintomáticos, a dificuldade da confirmação laboratorial da infecção pelo estreptococo do grupo A no sistema de saúde local e a possibilidade de outros sítios de infecção que não a garganta, como a pele por exemplo.

A prevenção secundária é feita após o primeiro quadro de febre reumática aguda sendo extremamente importante para reduzir o risco de novas infecções pelo agente e as lesões cardíacas causadas pela doença. O estudo prospectivo feito no Brasil na Universidade Federal de Minas Gerais ainda mostrou, na análise multivariada, que a recorrência de febre reumática, juntamente com a gravidade da cardite e a escolaridade da mãe,  é um fator importante na predição de doenças valvares crônicas graves sendo que 40% desses pacientes tiveram uma má evolução com pior prognóstico, dos pacientes participantes do estudo sem evidência de recorrência da doença menos de 10% apresentaram para lesões valvares. A associação significativa entre escolaridade da mãe e recorrência de FR reflete as condições socioeconômicas precárias do país.

O custo de um programa eficiente de prevenção secundária na Nova Zelândia corresponde a apenas 13% do orçamento gasto com complicações da Febre Reumática Aguda evidenciando o custo-benefício de medidas profiláticas. Além de que, o acompanhamento desses pacientes com um cardiologista reduz significativamente a mortalidade.

Apesar da FR ainda ser motivo de grande impacto na morbimortalidade em países de baixo desenvolvimento, diversos estudos apontam alternativas para sua erradicação. Medidas como diagnóstico precoce, estabelecido com auxílio de exames de imagem, como o ecocardiograma, atrelado a políticas de tratamento e profilaxia são extremamente eficazes na alteração do curso natural da doença. Através delas, também é possível diminuir os custos que a doença acarreta para o sistema de saúde público, uma vez que o gasto com medidas profiláticas é muito menor do que o gasto com tratamento de suas complicações. 

 

Apontamentos

  • A triagem ativa e o estabelecimento de critérios Ecocardiográficos padrão ouro para o diagnóstico da Doença Cardíaca Reumática subclínica otimizaria a intervenção e as medidas profiláticas minimizando a lesão cardíaca e as anormalidades valvares nesses pacientes.
  • O acompanhamento e a profilaxia secundária nos pacientes após o primeiro quadro agudo de Febre Reumática apresentam um significativo custo-benefício reduzindo a mortalidade e o orçamento gasto com complicações da FR.
  • Acesso à informação, capacitação dos profissionais de saúde local e a integração da comunidade local em campanhas educacionais são medidas primordiais para o êxito de ações de prevenção primária e secundária nas regiões endêmicas.

Literatura Sugerida: Marijon, D. E. et al. Rheumatic heart disease. The Lancet, v. 379, n. 9819, p. 953-964, mar./2012. doi:10.1016/S0140-6736(11)61171-9.

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