Os avanços no campo da intervenção transcateter das cardiopatias estruturais geram debates, muitas das vezes desnecessários sobre riscos de extinção de determinada especialidade médica, como se um procedimento revolucionário fosse capaz de suplantar todas as possibilidades de tratamento já experimentadas até então.
Exemplo máximo disso foi a falácia de que o TAVI viria para substituir a cirurgia cardíaca, o que nem de longe pode ser uma verdade.
Esse mesmo pensamento crítico ainda trouxe mais combustível para essa discussão, quando as abordagens transcateter de outras topografias começou a entrar na rotina clínica do cardiologista, como a clipagem da valva mitral insuficiente.
Para entendermos essa relação de procedimentos, basta analisarmos como se comportam essas prevalências de intervenções nos centros considerados mais experientes, que já tiveram algum tempo e volume para amadurecer tais técnicas.
Observando serviços que adotaram como prática clínica o implante de MitraClip, as taxas de procedimentos cirúrgicos nos trazem insights realmente interessantes.
A quantidade de cirurgias de reparo cirúrgico mitral não se alterou com a incorporação do MitraClip no dia a dia hospitalar, quando vemos de forma ampla os dados. No entanto, quando estratificamos para pacientes de alto risco cirúrgico, vemos uma desproporção entre os procedimentos.
Nessa coorte específica, que muitas vezes ficavam apenas em acompanhamento clínico, o MitraClip é a grande maioria, reduzindo drasticamente o número de abordagens cirúrgicas.
Agora, o mais interessante é quando observamos as demais estratificações. Nos pacientes de baixo risco cirúrgico, a intervenção convencional manteve seus números absolutos, mas agora apresentam melhores resultados, com menos eventos adversos, incluindo mortalidade aos 30 dias e 5 anos.
Se você que nos acompanha aqui ainda não pegou a razão para isso, basta buscar o conceito de Heart Team e aplicar nesse momento.
O Heart Team trouxe para a rotina diária uma melhor estratificação de risco dos pacientes, um estudo mais aprofundado de sua anatomia e decisões mais assertivas de qual procedimento a ser realizado. Inúmeros profissionais capacitados cada um em sua área de atuação trabalhando juntos para a melhor conduta e isso evidentemente impacta positivamente as técnicas que já eram utilizadas há anos.
Agora, um paciente que vá para a cirurgia convencional passa pela discussão de Heart Team tendo diversos aspectos melhor avaliados, munindo cirurgiões com ainda mais detalhes e clínicos com necessidades e prognósticos clínicos.
Além desse efeito mais direto, a melhor formação de profissionais que integram esses serviços também pode ter apresentado seu benefício nesses dados, afinal, com essa nova abordagem das cardiopatias estruturais, a busca por conhecimento nessa área de atuação melhorou significativamente o resultado dos procedimentos.
Atualmente toda essa tecnologia e estudo aprofundado serve para melhorar todas as áreas de atuação dentro da cardiopatia estrutural. Mesmo as técnicas já consagradas podem melhorar ou usufruir de informações novas que foram idealizadas para outras técnicas. É como dizem: “Quando a maré sobe, todos os barcos se beneficiam…”