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Prognóstico do PVM

Prevendo o futuro no ECG?

O prolapso de valva mitral é muito prevalente, afetando cerca de 170 milhões de pessoas mundialmente. Um pequeno subgrupo desses pacientes apresentará morte súbita cardíaca (0,14% a 1,8% ao ano), entretanto os preditores de risco para esse desfecho não estão bem estabelecidos na literatura.

Alterações do segmento ST e onda T na parede inferior, presença de acometimento bivalvular e de extrassístoles ventriculares complexas, disjunção do anel mitral e fibrose focal na topografia de músculos papilares e/ou segmento inferolateral basal do ventrículo esquerdo foram descritos em pacientes com eventos adversos malignos em alguns estudos prévios, contudo ainda carecem de evidências mais robustas de sua associação dado que parte desses achados são inespecíficos e pouco sensíveis.

Demonstrou-se previamente na literatura que uma rede neural convolucional, um tipo de inteligência artificial que utiliza o método de machine learning pela análise de padrões de imagens, foi capaz de identificar pacientes com e sem prolapso de valva mitral baseando-se em achados do eletrocardiograma.

Mas será que essa mesma ferramenta conseguiria discernir aqueles portadores dessa valvopatia sob maior risco de arritmias ventriculares complexas e morte súbita? E mais, será que a inteligência artificial seria capaz de predizer presença de fibrose miocárdica na ressonância cardíaca e até mortalidade apenas pela análise eletrocardiográfica?

Neste contexto, pesquisadores da Universidade da Califórnia – São Francisco extraíram do prontuário de 569 pacientes diagnosticados com prolapso de valva mitral informações como presença de fibrose em ressonância cardíaca, traçados eletrocardiográficos e a evolução clínica dos mesmos, como eventos arrítmicos maiores, morte súbita e cardiovascular, por exemplo.

Separaram então os eletrocardiogramas de base destes pacientes em dois grupos – aqueles que evoluíram com ou sem arritmias ventriculares complexas, definidas como ectopias pleomórficas isoladas frequentes, pares e episódios taquicardia ventricular não sustentada. Destes, 80% foram usados para criar o algoritmo e realizar o treinamento da rede neural. Dos 20% restantes, empregaram 50% para a fase de aprimoramento do algoritmo e 50% para a avaliação de sua capacidade diagnóstica. Utilizou-se o mesmo processo para avaliar a capacidade da inteligência artificial identificar fatores preditores no eletrocardiograma basal de fibrose miocárdica.

Nesta coorte histórica composta por 569 pacientes, 28% (n = 160) preencheram os critérios de arritmias ventriculares complexas, dentre os quais 47% (n = 75) apresentaram eventos arrítmicos maiores (morte súbita, arritmias ventriculares sustentadas – muitas vezes com necessidade de tratamento invasivo com ablação por radiofrequência). Vinte indivíduos (12%) do grupo com arritmias ventriculares complexas (correspondentes a 3% da amostra total) evoluíram com morte súbita, das quais 13 foram abortadas. Em contrapartida, nenhum dos pacientes do outro apresentou este evento.

Houve maior prevalência de prolapso de valva mitral envolvendo ambos os folhetos, disjunção de anel mitral e presença de realce tardio na ressonância cardíaca nos portadores de arritmias complexas. Não se observou diferença no tangente as características eletrocardiográficas, dentre as quais citamos ondas T achatadas ou bifásicas na parede inferior ou inferolateral, entre os 2 grupos.

Este estudo evidenciou que a inteligência artificial foi capaz de predizer arritmias ventriculares complexas (área sob a curva ROC = 0,8), fibrose miocárdica (AUC ROC = 0,75), morte cardiovascular (AUC ROC  = 0,72) e por todas as causas (AUC ROC = 0,82). Os parâmetros eletrocardiográficos que contribuíram para a predição de risco dos parâmetros supracitados foram segmentos associados a despolarização e repolarização ventricular, especialmente porções do complexo QRS, refletindo dano elétrico causado pela miopatia associada ao prolapso de valva mitral.

Fenômenos atriais, após análise múltipla e ajuste para outros fatores, não se relacionaram aos desfechos propostos. Estes achados sugerem que uma rede neural baseada em análise de traçados de eletrocardiograma pode detectar pacientes sob maior risco arrítmico e com fibrose miocárdica, independente da gravidade da regurgitação mitral ou do acometimento dos folhetos, permitindo que estes tenham um acompanhamento mais próximo de sua evolução clínica (Figura 1).

É evidente que a inteligência artificial irá mudar o futuro da medicina. No entanto, seria ela capaz de nos ajudar a identificar precocemente fatores de risco a ponto de mudar o destino de nossos pacientes?

Literatura Sugerida: 

1 – Tison GH, Abreau S, Barrios J, Lim LJ, Yang M, Crudo V, et al. Identifying Mitral Valve Prolapse at Risk for Arrhythmias and Fibrosis From Electrocardiograms Using Deep Learning. JACC Adv. 2023 Aug;2(6):100446.

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