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Prolapso de Valva Tricúspide

Descobrimos um novo inimigo?

Em diversos estudos anatomopatológicos datados da década de 70 do século passado, foram vistos que em pacientes com diagnóstico de doença mixomatosa da valvar mitral, havia acometimento concomitante da valva tricúspide, com redundância e prolapso dos folhetos, sugerindo um envolvimento difuso do tecido conjuntivo.

Inclusive, na época, chegaram a relatar uma prevalência de até 50% de acometimento simultâneo das valvas mitral e tricúspide.

Para se definir o diagnóstico de prolapso da valva tricúspide, os critérios utilizados no lado esquerdo foram extrapolados e muita confusão acabava por ser criada nesse diagnóstico, visto que disfunção valvar tricúspide em pacientes com prolapso da valva mitral eram rotineiramente classificados como insuficiência tricúspide secundária à elevação das pressões de enchimento do lado esquerdo e dilatação do anel tricúspide.

A definição de envolvimento primário da valva tricúspide ainda é complexa na prática diária e as condutas não são tão claras quanto vemos nos acometimentos do lado esquerdo.

No mesmo sentido, os métodos diagnósticos por imagem ainda enfrentam dificuldades na padronização de seus critérios. A ecocardiografia que é o método padrão ouro na avaliação inicial das doenças valvares tem suas limitações na avaliação da valva tricúspide e o conhecimento desses aspectos é ferramenta fundamental na decisão propedêutica da prática clínica diária.

Os 3 folhetos raramente podem ser visualizados simultaneamente, e há incerteza sobre qual dos folhetos é visualizado em cada vista, com sua avaliação sendo altamente dependente na angulação e rotação do transdutor.

Em outra esfera, a dos métodos multimodalidade, temos a ressonância do coração que não enfrenta os desafios de janelas desafiadoras e tem excelente acurácia espacial, mas não apresenta adequada avaliação funcional das disfunções valvares.

Baseados em critérios avaliados pela ressonância, o diagnóstico de prolapso de valva tricúspide pode ser definido na presença de deslocamento atrial de 2 milímetros dos folhetos anterior ou posterior e de 3 milímetros do folheto septal, diferenciando da valva mitral que apresenta apenas um parâmetro, o de 2 milímetros.

Viu-se também que o acometimento concomitante da valva tricúspide pode realmente chegar a 50% dos casos de envolvimento da valva mitral, mas em doenças mais avançadas, com envolvimento difuso dos dois folhetos mitrais, um espectro mais compatível com a doença de Barlow.

Dessa forma, regurgitação tricúspide em casos de prolapso da valva mitral não deve ser encarado como exclusivamente de origem secundária, mas deve ter uma avaliação bem criteriosa para definir se não se trata de envolvimento mixomatoso valvar.

Especificamente não se deve usar o corte de duas câmaras do ventrículo direito, pois isso traria um plano em que os pontos mais baixos do anel tricúspide estariam alinhados e poderia levar a um “pseudo-deslocamento” das cúspides tricúspides para o interior do átrio direito.

Um aspecto relevante para guiar condutas clínicas e decisões mais assertivas é o impacto da alteração anatômica na funcionalidade valvar. Não necessariamente um prolapso da valva tricúspide estaria acompanhada de regurgitação de grau importante devido as características anatômicas e geométricas do ventrículo direito. Aparentemente, o prolapso pode ter maior relevância clínica em casos em que o ventrículo esteja mais dilatado, mas isso ainda não está totalmente esclarecido.

Outro ponto a ser levado em consideração é a conduta muito bem estabelecida de plastia tricúspide concomitante a correções cirúrgicas do lado esquerdo, quando encontramos dilatação de anel e/ou regurgitação moderada ou maior.

Entendendo que boa parte das coortes avaliadas para estabelecer essa conduta pode ter sido de pacientes portadores de degeneração mixomatosa da valva mitral, o achado de que a regurgitação tricúspide tenha mais valor para indicar a intervenção do que a dilatação do anel pode ser justificada por um envolvimento mixomatoso concomitante e que acabou por ser beneficiado do reparo cirúrgico.

Nesse caso, talvez a ciência tenha mirado no gato e acertado no peixe…

Literatura Sugerida: 

1 – Guta AC, El-Tallawi KC, Nguyen DT, Qamar F, Nguyen T, Zoghbi WA, Lawrie G, Graviss EA, Shah DJ. Prevalence and Clinical Implications of Tricuspid Valve Prolapse Based on Magnetic Resonance Diagnostic Criteria. J Am Coll Cardiol. 2023 Jan 27:S0735-1097(22)07642-2.

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