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Regurgitação Mitral

Ecocardiografia e Inteligência Artificial

A regurgitação mitral primária representa uma condição clínica heterogênea que requer a integração de parâmetros ecocardiográficos para avaliar a gravidade da doença. No entanto, as diretrizes atuais restringem a avaliação do remodelamento do ventrículo esquerdo a dois marcadores ecocardiográficos, o diâmetro sistólico final do ventrículo esquerdo e a sua fração de ejeção, não considerando adequadamente o remodelamento atrioventricular nem as consequências na circulação arterial pulmonar e no ventrículo direito.

Essa limitação adicional pode, portanto, atrapalhar a estratificação de risco, dificultando a identificação do momento e do tipo ideais de intervenção na valva mitral, que já se configura como um desafio substancial, especialmente em pacientes assintomáticos.

Questionando se a inteligência artificial poderia gerar dados simples e acurados para aprimorar a classificação da gravidade da doença e assim determinar o momento ideal da intervenção predizendo desfechos clínicos,foi realizado um estudo com dois objetivos:

1) utilizar IA para identificar informações fisiopatológicas e prognósticas em subgrupos de pacientes com base em medidas ecocardiográficas padrão, e

2) validar esses fenótipos em relação aos desfechos clínicos futuros.

O estudo incluiu 400 pacientes com insuficiência mitral pelo menos discreta e de etiologia primária (prolapso, flail e doença de Barlow), de dois centros internacionais, de janeiro de 2008 a dezembro de 2019, empregando um processo em duas etapas. Em uma coorte francesa de 243 pacientes (modelo de treinamento – follow up médio de 38 meses), primeiramente, foram identificados fenótipos com base em 24 parâmetros ecocardiográficos convencionais. Em seguida, buscou-se distinguir esses fenótipos em características a fim de prever desfechos clínicos.

Estabeleceram-se dois “fenogrupos” rotulados como alta gravidade (AG) e baixa gravidade (BG). As variáveis com maior impacto na classificação de severidade foram volume diastólico e sistólico final do ventrículo esquerdo, relação E/e´, volume regurgitante pelo método de PISA, diâmetro do septo interventricular, tempo dedesaceleração valvar mitral e diâmetro sistólico final do VE.

Os resultados demonstraram eficácia da IA em prever desfechos. O fenogrupo AG mostrou uma taxa de encaminhamento mais rápido para intervenção valvar e, quando estratificado pela ocorrência da intervenção, exibiu uma melhoria significativa na sobrevida livre de eventos. Por outro lado, o fenogrupo BG não apresentou diferença significativa na sobrevida quando estratificado pela ocorrência da cirurgia.

A capacidade preditiva do modelo foi então validada em uma coorte externa e independente – coorte canadense de 157 pacientes, com follow up médio de 81 meses. Curvas de Kaplan-Meier foram usadas para comparar a ocorrência de intervenção valvar em cada coorte e entender o benefício dessa intervenção entre os fenogrupos.

Tanto na coorte canadense quanto na francesa observou-se que o grupo de AG apresentou uma menor sobrevida quando não realizado o reparo cirúrgico, enquanto o fenogrupo BG não apresentou diferença quando realizada intervenção. Nessa perspectiva, é possível inferir que a mera manifestação de sintomas em um grupo de baixo risco não implica necessariamente em uma modificação da sobrevida quando a cirurgia é indicada, sugerindo a possibilidade de um diagnóstico concomitante que possa estar perpetuando o sintoma.

Além disso, o estudo explora o valor incremental desses fenogrupos especialmente em pacientes com regurgitação mitral moderada a grave ou grave. Nesses pacientes, um modelo que incluiu as categorias de fenogrupo juntamente com a classificação convencional mostrou uma melhoria significativa na sobrevida livre de eventos com arealização de intervenção na valvar mitral em comparação com outro modelo que incluía apenas a classificaçãoconvencional.

Há de se destacar que a adição da informação do tamanho ventricular ao fenótipo, definido como um limite de 40 milímetros para o diâmetro sistólico final, proporcionou uma melhoria semelhante na reclassificação dos pacientes.

O estudo apresenta importantes limitações: 1) a natureza retrospectiva da análise, 2) um tamanho de amostra pequeno, 3) baixo índice de eventos, 4) não inclusão de medidas ecocardiográficas avançadas como strain longitudinal global, fração regurgitante, pressão arterial pulmonar ou acoplamento ventrículo direito-artéria pulmonar. No entanto, os resultados desta pesquisa, obtidos por meio da integração de dados ecocardiográficos com inteligência artificial, apresentam um potencial promissor para uma abordagem mais abrangente e precisa na estratificação de risco nessa específica população de pacientes.

Literatura Sugerida: 

1 – Bernard J, Yanamala N, Shah R, Seetharam K, et al. Integrating Echocardiography Parameters With Explainable Artificial Intelligence for Data-Driven Clustering of Primary Mitral Regurgitation Phenotypes. JACC Cardiovasc Imaging. 2023 Oct;16(10):1253-1267.

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