fbpx

Se a intervenção não é uma opção

Quais as evidências?

Se você já se viu pensando sobre como manejar betabloqueadores na estenose mitral e na insuficiência aórtica ou se teve medo de vasodilatar aquele paciente com estenose aórtica grave, você não está sozinho.

Se por um lado há evidências de altíssima qualidade respaldando tratamentos minimamente invasivos e inovadores para correção das valvopatias, por outro, no que tange ao manejo clínico, pouquíssimos estudos randomizados e controlados testaram terapias farmacológicas a fim de mudar a história natural das valvopatias.

E o pior: nenhum medicamento até hoje comprovou-se capaz de melhorar a sobrevida destes pacientes. Então o que fazer para aqueles aguardando intervenção ou mesmo para os não-candidatos a procedimentos invasivos, com objetivo de, além de reduzir sintomas, melhorar a hemodinâmica e evitar repercussões estruturais?

Por meio de evidências científicas robustas, de fato ninguém sabe ao certo. Mas no dia a dia, uma série de “crendices” terapêuticas são velhas conhecidas dos ambulatórios de valvopatias.

Diz-se, classicamente, por exemplo, que vasodilatar pacientes com estenose aórtica é contraindicado. Mas, na verdade, uma série de publicações falam a favor de efeito hemodinâmico benéfico no uso de iECA ou BRA na Estenose Aórtica grave e função ventricular normal ou reduzida. Isso sugere que a obstrução à via de saída nessa valvopatia não é totalmente fixa, até estágios mais tardios da doença; e a vasodilatação, quando necessária, parece ser não-inferior e, inclusive, eventualmente benéfica.

Entretanto, ressalvas devem ser feitas: são publicações com número pequeno de participantes, antes da era do TAVI, com desfechos diferentes, além de limitações e vieses que os tornam insuficientes para garantir início de vasodilatação de rotinana estenose aórtica, mas levantam a bola para a discussão.

Já na Insuficiência aórtica, uma das convicções é a de que agentes cronotrópicos negativos como os betabloqueadores piorem o débito cardíaco, ao prolongarem o tempo de diástole, e aumentarem o volume regurgitante.

No entanto uma única publicação randomizada e controlada prestou-se a responder essa dúvida clínica e incluiu pacientes com insuficiência aórtica moderada a grave submetidos a tratamento com succinato de metoprolol.

Ao final de 6 meses, apresentaram desfechos similares a pacientes tratados com placebo, incluindo avaliação da fração de ejeção, consumo de oxigênio (VO2máx) e qualidade de vida. O racional parece ser que a dilatação ventricular na insuficiência aórtica crônica ocorre muito lentamente, sofrendo complexa interação entre hemodinâmica valvar, miocárdio e alterações neuro-hormonais sistêmicas. Assim, preocupações históricas sobre os efeitos hemodinâmicos dos betabloqueadores na insuficiência aórtica crônica podem não ser justificadas.

Agora o contraponto: esta foi uma única publicação, que incluiu em sua coorte pacientes ainda longe de entrarem nas indicações de intervenção. Na certa, precisamos de estudos maiores e com maiores períodos de seguimento para avaliar o real papel dessa classe medicamentosa nos pacientes com insuficiência aórtica.

A terceira controvérsia comumente vista nos ambulatórios é sobre pacientes com estenose mitral em ritmo sinusal deverem obrigatoriamente estar em uso de betabloqueadores, no racional de que prolongar a diástole reduziria o gradiente médio através da válvula mitral.

O que se tem de publicações nesses padrões sobre o assunto, contra intuitivamente, revelam que estes pacientes apresentam queda nos valores de VO2máx no esforço após tratamento com betabloqueador. Mas sejamos francos: esta avaliação foi realizada após 1 semana de tratamento com essa classe medicamentosa e sabemos que em fases iniciais esta medicação tem um efeito inotrópico negativo até que haja adaptação. Logo, deve-se ter cautela ao extrapolar tais dados para a prática clínica. Ainda assim, coloca em xeque uma prática que por muitos ainda é rotineira.

     A verdade é que fica clara a discrepância do nível de evidência científico que temos relativo a tratamentos intervencionistas versus farmacológicos no âmbito das doenças valvares. Por esta razão é que os tais hábitos da prática clínica continuam sendo a regra, baseadas em fisiopatologias que têm bastante de teoria, mas muito pouco de comprovação científica prática.

Se antes dessa publicação havia dúvida sobre como manejar betabloqueadores na estenose mitral e na insuficiência aórtica ou se vasodilatar pacientes com estenose aórtica grave era correto, depois dela continuamos ávidos por respostas – mas por meio de evidências robustas. Ao menos sabemos que a bola está levantada, haja pesquisa de qualidade para cortar.

Literatura Sugerida: 

1 – AR Barry, EHZ Wang. Therapeutic Controversies in the medical management of valvular heart disease. Annals of pharmacotherapy 2021, Vol 55 (11) 1379-1385.  

Confira o artigo completo

Compartilhe esta postagem

Privacidade e cookies: Este site usa cookies. Ao continuar no site você concorda com o seu uso. Para saber mais, inclusive como controlar cookies, veja aqui: Política de cookie

As configurações de cookies deste site estão definidas para "permitir cookies" para oferecer a melhor experiência de navegação possível. Se você continuar a usar este site sem alterar as configurações de cookies ou clicar em "Aceitar" abaixo, estará concordando com isso.

Fechar