O Heart Team atuante
Quando observamos desfechos duros em gestantes, a grande maioria das vezes há estreita relação com doenças cardiovasculares, sendo responsável por mais de 80% das causas de morte materna ou mesmo de complicações materno-fetais.
A julgar pela idade das gestantes, a grande maioria das causas de doenças cardíacas que acomete essa coorte é de origem congênita ou até mesmo valvar adquirida, com a cardiopatia reumática tendo papel importante.
Embora boa parte dos mecanismos patogênicos ligados aos desfechos desfavoráveis não estejam claros, a gestação acaba por desmascarar a perda de reserva funcional que a mulher apresenta ao lidar com a cardiopatia.
Diante desse contexto, uma avaliação pré-natal adequada e de perto é fundamental e muitas vezes decisório para uma evolução controlada e favorável.
Uma vez que a paciente apresenta a gravidez, é esperado um aumento de 30 a 50% do débito cardíaco, secundário basicamente ao aumento da volemia e em menor grau da frequência cardíaca. A frequência cardíaca aumenta progressivamente durante toda a gravidez de 10 a 20 batimentos por minuto, atingindo o máximo no terceiro trimestre. Em geral, essa mudança na frequência representa um aumento de 20% a 25% acima da linha de base da mãe.
Associado a isso, no segundo trimestre há uma queda da resistência vascular periférica com aumento da mesma no terceiro trimestre até o termo. Essa combinação de alterações hemodinâmicas pode ser perigosa em determinadas condições cardiovasculares de sobrecargas, como no caso das valvopatias de graus avançados, mas que estejam compensadas.
Outro ponto perigoso é a hemodinâmica materna durante o trabalho de parto influenciados pelo próprio trabalho, pela dor e pelas analgesia e anestesia. Isso pode ter um efeito profundo sobre uma cardiopatia pré-existente, especialmente por causa de grandes mudanças de volume e stress miocárdico.
As contrações uterinas levam a uma autotransfusão de 300 a 500 mL de volta à circulação e a resposta simpática à dor e ansiedade elevam ainda mais a frequência e a pressão arterial. Todas essas alterações podem resultar em descompensação de uma insuficiência cardíaca em mulheres com lesões valvares obstrutivas do lado esquerdo, como estenose aórtica e/ou estenose mitral, ou disfunção ventricular direita em quadro de hipertensão pulmonar grave.
Durante o período pós-parto precoce, a transferência de líquido do espaço extravascular aumenta o retorno venoso ainda mais. Nas mulheres portadoras de cardiopatias, esse momento também apresenta maior risco de edema pulmonar, apontando para um momento crítico entre o momento do parto e seu seguimento.
Há consenso de que um parto vaginal planejado para a maioria das mulheres com valvopatias, incluindo aquelas com doença de alto risco. O parto cesáreo é geralmente reservado para indicações obstétricas, exceto em casos de intoxicação cumarínica de gestantes que não suspenderam o uso da varfarina antes do termo. Nesse caso, o parto vaginal aumenta o risco de sangramento de sistema nervoso central do concepto.
Nesse contexto, parece interessante que o conceito de Heart Team possa ser aplicado nas gestantes com valvopatias, em que cardiologistas e obstetras discutem em conjunto as melhores alternativas desse pré-natal e um ponto decisivo nessa história é conhecer bem a fisiologia da gestação e das doenças valvares.
Literatura Sugerida: Sharma G, Ying W, Silversides CK. The Importance of Cardiovascular Risk Assessment and Pregnancy Heart Team in the Management of Cardiovascular Disease in Pregnancy. Cardiol Clin. 2021 Feb;39(1):7-19.
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