Valvopatia Moderada

Atletas de alto rendimento com regurgitação valvar das câmaras esquerdas classificadas como moderada apresentam diferenças na capacidade cardiopulmonar, metabólica e/ou estrutural cardíaca quando comparados a atletas sem refluxo? O artigo “Capacidade cardiopulmonar nos atletas de elite com regurgitação mitral ou aórtica” busca responder essa intrigante pergunta, uma vez que a relevância desse grau de acometimento valvar no acompanhamento de atletas competitivos ainda gera dúvidas na prática clínica.

O estudo avaliou atletas de alto rendimento do futebol e handball que apresentavam refluxo valvar mitral ou aórtico classificado como moderado no ecocardiograma bidimensional. Eles foram comparados ao grupo controle, composto de companheiros de equipe sem alteração valvar, com as mesmas condições de treino e que não apresentavam diferenças significativas em altura, idade e peso corporal.  Foram excluídos atletas com refluxos leves, outros defeitos valvares, estenose mitral, estenose aórtica e doença estrutural com exceção da valva aórtica bicúspide e prolapso mitral. 

Foram comparados parâmetros anatômicos, metabólicos e a capacidade cardiopulmonar entre os grupos. Dentre estes parâmetros, somente o anatômico, avaliado através do ecocardiograma, apresentou diferença significativa, revelando um aumento do diâmetro diastólico final do VE no grupo com regurgitação moderada. Não houve diferença significativa entre os grupos quanto a espessura do septo interventricular, parede posterior, espessura do VE e espessura relativa da parede, e foi observada, como esperado para a população de atletas, hipertrofia excêntrica do VE nos dois grupos.  

Outro ponto analisado foi a capacidade funcional dos atletas, avaliada através da ergoespirometria, com o objetivo de atingir o nível de resistência máxima subjetiva. Este parâmetro foi importante pois poderia impactar no desempenho dos atletas, porém tanto a capacidade funcional quanto o VO2 predito não apresentaram diferença entre os grupos. Finalmente, foi feita uma análise metabólica, utilizando lactato e BNP coletados durante o exame de exaustão, que também não apresentaram diferenças importantes entre os atletas.  

Neste estudo a incidência de regurgitação moderada foi de 2,7%, dentre os quais somente 3 atletas possuíam etiologia primária (PVM e valva aórtica bicúspide), e não foram observados comportamentos hemodinâmicos ou metabólicos diferentes nesse subgrupo. Porém, é de extrema importância a busca ativa por marcadores de risco da doença de base, uma vez que, quando presentes, a conduta pode mudar devido ao aumentado risco de morte súbita (ver editorial Prolapso de Valva Mitral em https://thevalveclub.com.br/prolapso-de-valva-mitral-5/). 

Já a profilaxia de endocardite com antibióticos nos atletas com regurgitação valvar moderada não se faz necessária, com exceção dos indivíduos com endocardite prévia, valvas protéticas ou doença cardíaca congênita, embora isso ainda seja tema de muito debate comparando as diretrizes nacionais com as internacionais

Assim, pelos dados apresentados pelo presente trabalho, pôde se concluir que o refluxo mitral ou aórtico moderado isolado NÃO foi um critério para contraindicar ou afastar o atleta da prática de atividade física competitiva. Contudo, a avaliação pré-participação e acompanhamento do atleta de alto rendimento através do ecocardiograma e teste cardiopulmonar com protocolo que se assemelhe ao esforço realizado em sua rotina de treinos é primordial. Por fim, mais estudos sobre o tema são aguardados para consolidação das recomendações práticas para atletas com essas valvopatias.