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A Multimodalidade de Imagem

A Multimodalidade de Imagem

Avaliação da Valvopatia Mitral

A doença valvar mitral é a valvopatia cardíaca mais prevalente, apresentando-se como estenose mitral (EM) ou insuficiência mitral (IM). A insuficiência é mais comum que a estenose, chegando a acometer cerca de 1,8% da população geral e até 10% dos indivíduos com mais de 75 anos. 

O conhecimento da anatomia e função do aparato mitral são essenciais para compreender e diagnosticar sua disfunção e para auxiliar no planejamento do tratamento. A valva mitral é composta pelo ânulo, dois folhetos ou cúspides, cordas tendíneas e músculos papilares, que juntos formam o aparato valvar mitral e permitem o adequado funcionamento da valva. 

O ânulo valvar mitral possui um característico formato em sela e relaciona-se anteriormente com a fibrosa intervalvar mitroaórtica. As cúspides inserem-se ao longo do ânulo e apresentam tamanhos diferentes, sendo cada uma composta por 3 segmentos: A1, A2 e A3 para a cúspide anterior e P1, P2 e P3 para a cúspide posterior. 

Tais cúspides são tensionadas por cordas tendíneas que se conectam a dois músculos papilares: papilar posteromedial e papilar posterolateral. O comprometimento de qualquer uma dessas estruturas pode levar à disfunção valvar. Entender o papel e as limitações das diferentes modalidades de imagem na avaliação da valvopatia mitral é essencial para o diagnóstico preciso e escolha do melhor tratamento.

O Ecocardiograma Transtorácico (ETT) é o primeiro exame para rastreio, diagnóstico e seguimento das doenças que acometem a VM, sendo ainda o método principal para avaliação da etiologia, morfologia e severidade tanto da insuficiência, quanto da estenose (figura 1). Figura 1: Imagem de ETT destacando os segmentos das cúspides anterior e posterior da VM. (Fonte: Braunwald’s Heart Desease 11th edition).

A imagem tridimensional (3D) permite uma melhor avaliação da mitral, sendo o ecocardiograma transesofágico (ETE)-3D um importante instrumento intraoperatório e na sala de hemodinâmica. O ETE-3D tem se mostrado promissor em relação ao bidimensional em alguns aspectos, principalmente por permitir uma visualização da valva mitral de forma global e próxima da anatomia já conhecida por cirurgiões e hemodinamicistas, facilitando o entendimento anatômico e comunicação entre a equipe. Além disso, a melhor avaliação anatômica e funcional deste método possibilita a escolha da intervenção mais adequada (troca valvar x plastia) e do momento de se indicar essa intervenção.

A Tomografia Computadorizada Cardíaca permite uma avaliação precisa da anatomia tridimensional do aparato mitral e da sua relação com estruturas vizinhas. Este método tem papel complementar na avaliação de leak paravalvar (figura 2), situação em que muitas vezes a ecocardiografia possui limitação por artefatos da prótese valvar.

Figura 2: Reconstrução tridimensional por TCC demonstrando leak paravalvar mitral (visão átrio esquerdo).

No que tange ao implante de valva mitral transcateter, a tomografia é imprescindível, tanto para medir o anel mitral, guiando a escolha do tamanho dos dispositivos, como para avaliar a interação da prótese com a via de saída do VE (VSVE), evitando a complicação mais temida e fatal: a obstrução da VSVE (figura 3). Além disso, com o advento de tomógrafos com alta velocidade de rotação, abriu-se a possibilidade de avaliar estruturas que se movimentam mais rápido, como as cúspides, folhetos protéticos, vegetações e trombos.

Figura 3: Planejamento por TCC de implante transcateter “valve-in-valve” mitral (painel A) com simulação de prótese virtual e impressão 3D (painel B).

A Ressonância Magnética Cardíaca é conhecida por permitir, em um único exame, acurada quantificação dos volumes cardíacos e fluxos transvalvares, assim como caracterização e quantificação da fibrose miocárdica. Sua utilização se dá especialmente nos casos em que a avaliação ecocardiográfica é duvidosa ou limitada. 

Em pacientes com insuficiência mitral importante por prolapso (primária), mas assintomáticos, a quantificação da insuficiência pela ressonância pode ajudar a prever quem evoluirá mais rápido para necessidade de cirurgia (figura 4). Figura 4: Imagem de RMC evidenciando IM associada à prolapso dos folhetos da VM e à disjunção do anel da VM.

Além disso, a avaliação da fibrose miocárdica, agora em pacientes com insuficiência mitral funcional (ou secundária) com ventrículos doentes, parece não só ajudar no diagnóstico etiológico da miocardiopatia subjacente, mas potencialmente predizer qual paciente se beneficiará mais da intervenção na válvula.

Em resumo:
O aparato valvar mitral é complexo e, quando doente, requer uma avaliação pormenorizada dos seus elementos. O ecocardiograma é o principal exame para a definição da etiologia da valvopatia, avaliação anatômica das cúspides e severidade da doença; a tomografia tem papel crescente, principalmente no planejamento do tratamento percutâneo devido sua melhor definição anatômica do anel valvar e estruturas adjacentes; e a ressonância com sua acurada avaliação dos ventrículos, quantificação da regurgitação e caracterização tecidual, tem se mostrado promissora na definição do tratamento em casos mais duvidosos. 

O entendimento do potencial das diferentes modalidades de imagem cardíaca permite uma abordagem mais completa e individualizada da valvopatia mitral e consequentemente a escolha da melhor terapêutica.  

Literatura Sugerida: 

  1. – Kim, D-H; Multimodality Imaging for the Assessment of Mitral Valve Disease; Cardiol Clin 39 (2021) 243–253.
  2. – Lopes BBC, Kwon DH, Shah DJ, Lesser JR, Bapat V, Enriquez-Sarano M, et al. Importance of Myocardial Fibrosis in Functional Mitral Regurgitation. JACC: Cardiovascular Imaging. 2021 Feb;S1936878X20311098.
Lara de Moura Leite
Leoncio Bem Sidrim

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